sexta-feira, 10 de abril de 2009

É GRAVE A CRISE . . .

A moeda permite que os preços de milhões de coisas incomensuráveis sejam expressos em unidades de um bem homogêneo. É por causa da moeda que se consegue transitar racionalmente pelo complicado mundo econômico, calculando-se o valor relativo do que se quer e do que se precisa, do que se pode e do que não se pode ter. A taxa de juros reflete a proporção entre gastos e poupança das pessoas, entre o presente e o futuro. É graças a ela que os empresários conseguem planejar racionalmente os investimentos com os recursos que a taxa de juros mostra que estão disponíveis. Moeda e taxa de juros são marcos absolutamente indispensáveis de racionalidade econômica que pressupõem um quadro de instituições, como a propriedade privada, e virtudes, como a honradez pessoal, que são insubstituíveis. Acontece que o sistema político contemporâneo não pode funcionar senão destruindo a moeda e falsificando a taxa de juros. Isso elimina a racionalidade e resulta em distúrbios econômicos graves. Dessa forma, o sistema político contemporâneo destrói a possibilidade de prosperidade material crescente que é um fundamento essencial para sua própria existência. Essa contradição insolúvel, que resultará mais cedo ou mais tarde num colapso social desastroso, decorre de que o “cidadão comum” quer a prosperidade econômica contínua e eterna, mas não quer compreender as bases de sua possibilidade, nem fazer os sacrifícios e assumir as responsabilidades que ela demanda. Não adianta condenar somente as "elites" pela nefasta cultura moderna. O "povo" também tem culpa no cartório. O “cidadão comum” das modernas democracias exige a riqueza que somente o capitalismo propicia, ao mesmo tempo em que não abre mão da tutela estatal de todos os aspectos de sua vida, que somente o socialismo pode oferecer. Essa síntese capitalista-comunista é, claro, ilusória e impossível. O drama da atualidade é que essa ilusão impossível é o objetivo para o qual convergem todos os vetores políticos, culturais e intelectuais influentes. A corrupção da mentalidade vigente é tão profunda que, creio, não tem mais conserto. Vamos até o amargo fim, que não sei quando virá, espero que demore ainda, mas sei que vem por aí. A crise econômica atual, como todas, decorre sobretudo da ingerência estatal na moeda e na taxa de juros, que infunde irracionalidade num sistema em que todo mundo atua presumindo racionalidade. A inflação bagunça o cálculo econômico e os juros baixos sugerem uma abundância inexistente de recursos para investimento. Para piorar as coisas, o crédito barato chegou também aos consumidores (o que não acontecia antes, ao menos na escala de hoje), que, nos Estados Unidos, se endividaram terrivelmente. A atuação econômica tem um elemento subjetivo, as avaliações que as pessoas fazem da realidade, e um elemento objetivo, que é a própria realidade. O controle estatal da moeda e do juro interpõe uma barreira entre as pessoas e a realidade econômica, que é substituída por miragens. As avaliações que se baseiam em miragens serão necessariamente errôneas. Essa dissonância entre as análises subjetivas e a realidade objetiva tem limite num dado existencial inafastável, a escassez, que o Estado tenta abolir, mas que a crise econômica subitamente revela. Trata-se de um choque de realidade, um duro despertar do mundo de sonhos. Os consumidores, poupadores e investidores estavam baseando seus planos em uma situação objetiva irreal. O certo a se fazer é deixar acontecer o ajuste subjetivo ao real. É doloroso, mas não há outro remédio. Empresas cortam custos e limitam investimentos. Consumidores renunciam ao supérfluo para equilibrar as finanças. Todos refazem seus projetos. Feita a adaptação dos planos ao estado objetivo da economia, a normalidade retorna. O problema é que deixar acontecer essa acomodação entre os elementos subjetivo e objetivo da economia, que é a única saída para a crise, é politicamente mais inaceitável agora do que jamais foi. O “cidadão comum” não admite ter que apertar o cinto, pagar suas dívidas, cortar despesas, mudar de emprego. Ele não aceita sofrer desconforto algum. Ele espera que o Estado dê um jeito de manter tudo como está. Ele admite que o Estado use qualquer meio para atingir esse fim, mesmo a estatização de bancos, seguradoras, grandes empresas, de tudo. O "cidadão comum" espera que o Estado providencie "liquidez", isto é, mais dinheiro, mais inflação, que a taxa de juros seja negativa. Ele quer ser pago para tomar dinheiro emprestado. É claro que isso paralisa a economia pela impossibilidade de se fazer o acerto de contas dos agentes com a realidade, aprofunda as distorções e, em última análise, destrói a própria moeda e a economia junto com ela. Já se fala em trilhões de dólares com a maior naturalidade. Em breve serão quatrilhões e o dólar vai para a vala comum do nosso cruzeiro, cruzado, mil-réis, cruzado novo etc. Essa situação deprimente se consolidou também nos Estados Unidos. Já vão longe os tempos em que o “cidadão comum” americano era o fazendeiro ou comerciante cioso de sua autonomia e independência, transitando num meio moral religioso. O “americano médio” de hoje tem a mente completamente estatizada e aceita de bom grado a total amoralidade liberal reinante. Ele espera de Barack Obama a cura de todos os males econômicos, desde que não tenha que fazer sacrifícios pessoais. Ele vai aplaudir tudo o que o novo presidente fizer, mesmo que dê completamente errado e não resolva nada. Aí ele vai exigir providências ainda mais drásticas que também vão falhar e assim por diante. Não é um círculo vicioso, mas uma espiral descendente que acabará muito mal. É o mesmo filme do New Deal de Roosevelt, só que o "remake" tem tudo para ser ainda pior. /Alceu Garcia