Acampar ou fazer aquela viagem inusitada e sem conforto: os legítimos programinhas de índios. Vontade de reencontrar o meu lado criança, de virar moleque novamente. Nem lembro da época em que não tinha muitas preocupações, quando tudo vinha com sabor de novidade e energia eu tinha de sobra, para dar e vender. Em algum canto da minha memória deve estar registrado o tempo em que eu era mais espontâneo, dizia o que sentia sem rodeios e me divertia horrores com coisas banais, como um carrinho de brinquedo ou um amontoado de bolinhas de gude. Será que essa criança ainda existe? Talvez um pouco escondida, um tanto ressabiada ou reprimida por conta das responsabilidades da vida adulta. Será possível acordar o garoto que eu já fui um dia e viver com mais leveza e irreverência? Como despertar o lado mais bacana do universo infantil, o menininho doce e curioso, agora em forma de homem culto e versado em muitos saberes? Vontade de empinar pipa, dar um “pastelão na pasta do colega”, grudar nas costas do danado o aviso de “chute-me”. Banho de chuva. Banho de mangueira no quintal. Catar conchinhas na praia, fazer castelos de areia, observar as formigas sob o quentinho do sol, comer pitangas, rolar na grama. Inocência e frescor, brincadeira e leveza, corpo e emoção, curiosidade e criatividade, senso de aventura e liberdade. São estas coisas que garantem a felicidade. Não tem dinheiro no meio, não tem segurança e estabilidade, também não dependem nem de nada nem de ninguém. Muito menos de condições especiais, do trabalho, de pré-requisitos, ou de como a coisa deve ou não deve ser, essas manias de gente adulta. Mas qual o quê! Tenho outras necessidades, compromissos e responsabilidades. Criei vínculos, travas, mordaças. Mas será que não dá mesmo para conciliar as duas coisas? Será que não dá para buscar mais leveza e frescor, espontaneidade e alegria ou aventura e irreverência em minha vida? Fico aqui escrevendo para ninguém e parecendo tão infantil. E depois eu era aquela criaturinha tímida e sensível com o cobertorzinho na mão e o último a ser escolhido na hora do jogo de futebol; passado para trás pelos mais espertos, aquele menino que sempre preferiu seu mundo interno, a leitura, os sonhos e as paisagens da natureza. Tudo isto para registrar que comprei o notebook de última geração. Definitivamente aceitei que já fui criança, pelo menos aquela que acredito ter sido um dia ou a que ficou registrada na minha psique. Verdadeiramente infantil. Bom, agora que redescobri como o garoto era e ainda pode ser, vou divertir-me com o meu brinquedinho. Vou brincar, investindo no meu próprio sonho, mesmo com adaptações. Tão bom como tomar sorvete, jogar pingue-ponte ou brincar de esconde-esconde. E enquanto me divirto instalando os programas e personalizando a máquina, idéias surgem aos borbotões em minha mente, numa fonte insuspeita de vitalidade, intuição e abertura. Por isso é que nesta maravilhosa e bendita sexta-feira, vou chegar em casa com aquele sorrisão no rosto, louco para brincar e folgar. Mesmo fisicamente exausto e com fome por causa do regime que já me tirou cinco quilos dos tantos, a vida está me parecendo tão boa e generosa que dá vontade de realizar coisas, amar as pessoas e ser feliz. /AFINAL DE CONTAS