sexta-feira, 1 de agosto de 2008

PAUTA DO DIA ( PANTANAL É MUITO LONGE )

O Projeto Cine Favela está levando projeções pro povo de onde?, de onde? De Paraisópolis, é claro. Nenhum projeto desses acharia de se despencar para a Favela Pantanal, porque é muito looooonge! Paraisópolis e Heliópolis, comunidádjis mais “integradas” (leia-se: próximas) ao gestalt urbano (hummm…), são a nossa Rocinha pós-Conceição, aquela favela fofa, pela qual todo mundo nutre um sentimento de simpatia igualmente fofa.Olha só que foto piedosa: essa gente toda terá cinema escolhido pelos pela classe média mezzo fefeléchi, mezzo PUC, enquanto a animação filantrópica durar. Essas crianças já têm aulas de berimbau, capoeira, balé, manejo com recicláveis, e até uma sucursal do Einstein lá dentro. Não lhes sobra tempo nem de bater uma bolinha, tamanha a quantidade de gente ba-ca-na querendo purgar sua culpa endinheirada - além de acabar com assaltos na vizinhança, é claro.Entendo que essas iniciativas são de boa intenção, mas se igualam a dar um pirulito pro menino no sinal: não servem pra absolutamente nada, a não ser livrar a consciência dos que as promovem. Senão vejamos: os pobres, apesar de pobres, têm o sagrado direito de escolher a que hospital ir, que profissão abraçar, a que hobbie se dedicar. E se uma menina dessas enfiasse na cabeça de entrar pro hipismo? Nã nã ni nã não, é capoeira ou balé. Ou então preparar os enfeites de garrafa pet pro Natal. Escolhe. E nem pensar em dar chilique, porque estamos lhe fazendo um favor.E se ela quiser ler um livro que acabou de sair? Não, só pode escolher entre aqueles da biblioteca que alguém teve a iniciativa de montar, nem que a estante só tenha velharias jurídicas. Ela, a menina, tem de dar valor à leitura, seja ela qual for, e fica lindo ver sua perseverança em livros cheios de ácaro. Suas vizinhas etárias do Morumbi, nem pensar!: têm rinite. ONGs, madames e cineastas legais ajudam apenas a legitimar espaços horrorosos onde se vive mal. No fundo, no fundo, douram a coisa a fim de mantê-la e fazer crer aos coitados que morar em favela pode ser uma coisa suuuuper-lúdica. E o povo acaba acreditando - “esse é meu lugar, esse é meu cantinho”.Eu queria mesmo é que um baiano desses pudesse ter perspectivas pra juntar dinheiro, sair daí com uma fragorosa banana, dizendo: eita, lugar da peste!, e escolher um imóvel de seu agrado, no lugar que lhe convier, com todas as malícias e conhecimentos e orientações e preferências que qualquer um de nós tem. Chato, não? Chocante até… Mas ele tem direito. Carolina Iskandarian.