domingo, 26 de outubro de 2008

GRAFITEIROS, ARTISTAS OU MARGINAIS ?

Nunca entendi a revolta de parte dos grafiteiros contra seus colegas que conseguem expor desenhinhos em galerias e museus, já que o universo temático de todo grafite metido a arte (variações sobre câmeras de vigilância, código de barras, capitalista na porta do hospital que pergunta "débito ou crédito?" a uma mulher segurando o filho doente pela mão) é o mesmo usado por qualquer expositor-de-bienal caricato, de quem os grafiteiros ingenuamente se acham o completo oposto. Mas deve ser porque o grafiteiro anti-museu sabe que, assim que seus rabiscos perderem o status de contestação e marginalidade, eles vão passar a ser julgados pelo que realmente são, e não pelas fantasias sobre arte de rua que inspiram em idiotas – e aí, é claro, o grafite vai levar a pior, mesmo se comparado aos retratos do Roberto Camasmie ou às bandeirinhas do Alfredo Volpi (que, além de serem só desenhos de bandeirinhas, ainda conseguem ser desenhos ruins de bandeirinhas). É por esse mesmo motivo que os grafiteiros podem estragar a cidade inteira com desenhos cuja autoria seria renegada até por um bugio lobotomizado; podem pintar figuras de meninos de rua até na parede do lavabo do governador; podem pichar um terceiro mamilo na estátua do Duque de Caxias; mas nunca vão deixar de gritar "opressão! nossa arte é valorizada no exterior e marginalizada em nosso próprio país!" quando a prefeitura apagar sem querer (infelizmente) o grafite de algum desses poetas urbanos num murinho qualquer. Eles repetiriam aos berros que são artistas marginais mesmo se contassem com o apoio financeiro do Partido Republicano, porque sabem muito bem que, quando esse discurso não colar mais, voltarão a ser só um bando de maus desenhistas. Cansei de ver gente apostando que o grafite em breve vai ser considerado arte de adulto – mas eu apostaria que não, e apostaria dinheiro. Posso estar errado, e testemunhar o dia em que o Louvre entregará a Mona Lisa nas mãos d'osgemeos para eles atualizarem a obra, espalhando aleatoriamente pela tela imagens de iPods e de PMs violentos. Mas esse não vai ser o dia da elevação do grafite ao nível do Louvre, e sim o dia do rebaixamento do Louvre ao nível de algo que eu não usaria nem para adubar ervas daninhas. Uns anos atrás esses bocejantes osgemeos ganharam uma exposição numa galeria de arte, e os segundos cadernos que eu li na época celebraram o nobre espaço conquistado pelo grafite e também o aumento de público que a mostra provocou na galeria. Dois equívocos aí. Primeiro, as galerias de arte de São Paulo não são propriamente conhecidas por seu alto grau de exigência; segundo, que o aumento de público só mostra que quanto mais o nível baixa mais gente se interessa – se osgemos dobraram o público da Fortes Vilaça (cujo dono conseguiu a proeza de se chamar Baixo Ribeiro), imagine a retrospectiva fotográfica Marriete e Silvinha - Do Viva a Noite à Eternidade, o que não seria menos artístico do que qualquer grafite premiado. Pessoas que gostam de grafite também são fascinadas por motoboys, por algum motivo inexplicável, e adoram falar que "Grafiteiros e motoboys são os maiores símbolos de SP" para se passarem por perigosos freqüentadores de becos e vielas, o que é tão ridículo quanto o fotógrafo que vai a Paris e só consegue enxergar os varredores de rua argelinos; por mais que jure que suas fotos são uma forma de denúncia, ele não percebe o quão passivamente mulherzinha fotografar árabes durante trabalho braçal soa. Eu aceitaria de bom grado ouvir "Grafiteiros e motoboys são os maiores símbolos de SP", mas desde que da boca de alguém que estivesse no aeroporto, justificando sua mudança para outro continente – "qualquer outro continente", enfatizaria ele à mocinha no balcão de passagens. /coisasdeidiota.blogspot.com