domingo, 5 de outubro de 2008

ONDE VÔCE MORA ?

Há poucos dias eu estava em casa a procura de alguns endereços. Encontrei uma lista antiga amarelada pelo tempo, de nomes e endereços de amigos.Fitei meus olhos naqueles endereços e descobri que nomes de ruas carregam a possibilidade da imaginação do lugar. As ruas são lugares de passagem, a função delas é ser caminho; outra possibilidade é ser referencial da pessoa procurada. Ruas também desejam imortalizar nomes, pessoas. Ruas revelam divisão de classe, de poder, de gênero. Rua é lugar de se pisar, de por a mão de ser. Hoje muitas das vezes quando se pergunta qual é seu endereço? A resposta é: ig, hotmail, bol, yahoo, oi, uol entre outros. Estes provedores geram endereços eletrônicos, sem ruas empoeiradas, sem aguçar a imaginação do lugar. Outra coisa interessante: Muita gente mora e não sabe o nome da sua rua, estes na verdade não se engajaram na vida da comunidade. Talvez você que está lendo, more em algumas destas ruas que estão nesta lista. Eis alguns nomes: Rua da Liberdade, rua da democracia, rua gentileza, rua da senha, rua vermelha, rua da fofoca, rua tem que ser assim, rua não perdoou, rua mando eu, rua dos sonhos, rua da felicidade... Por exemplo, na rua da democracia: vejo crianças em meio à poeira brincando, com suas pernas cinzentas de tanto correr em busca da democracia; vejo muito riso, dança, festa, gente, mulheres tecendo os fios coloridos da diversidade; vejo a rua larga da passagem da justiça.Rua, da liberdade: Vejo correntes no chão, mesa, partilha; vejo crianças brincando de amarelinha.Rua tem que ser assim: Parece que cada dia as pessoas se mudam para esta rua da prepotência, do poder centralizado; lá mora a inflexibilidade, impossibilidade de equipe. Em contraste, existe a rua da gentileza, quase deserta, pouca gente mora lá. Na rua da gentileza existe um letreiro bem grande: “Veja quem está ao seu lado”. A gentileza só é possível quando percebemos o outro, a outra. Dê uma olhada ao seu redor e questione: Com quem eu deixei de ser gentil? Ainda existem ruas proibidas, quero dizer “senhadas”. Só tem acesso um pequeno grupo que sabe da senha. Aliás, nesta rua tudo é “senhado”: (Desculpe, a palavra senhada, você não vai encontrar em dicionários, pois terá que saber da senha). Religião, política, educação. Até para namorar, precisa de senha. Bem verdade que lá só moram burocratas. Por fim a rua dos sonhos: Esta rua é feita de ausência e de certeza... Esta rua foi sonhada, pelo imaginário das pessoas que acreditam em um espaço para todos e todas. É uma rua cheia de brinquedos que nos fazem sonhar. A cada esquina tem uma cadeira de balanço; elas servem para ninar os sonhos, trazer esperança no abrir dos olhos, no levantar da igualdade. Rua dos sonhos é o endereço das pessoas que lutam por justiça, acreditam na força do balanço da esperança, que na hora de dormir cobrem suas próprias pernas e beijam a testa da criança que mora em cada um e cada uma. Espero encontrá-los, encontrá-las, nesta rua. /Rodrigo Dias